Guia para estudar filosofia

1 de Setembro de 2009   Filosofia

José Costa Junior

Como Estudar Filosofia: Guia Prático Para Estudantes de Clare Saubders, David Mossley, George Macdonald Ross, Danielle Lamb e Julie Coss Tradução de Vinicius Figueira

São Paulo: Artmed, 2009, 168 pp.

O que o aluno ingressante no curso de filosofia pensa sobre a disciplina? O que espera encontrar durante a graduação em filosofia? Tal exame é bastante interessante, pois podemos nos surpreender com as respostas e talvez com nossa própria experiência. Nesse contexto, este livro não é apenas uma introdução produtiva à disciplina, mas uma preparação bastante interessante para o curso de filosofia.

Dividido em seis partes, que tratam desde uma rápida introdução até uma elucidação sobre a leitura de textos filosóficos, o livro é estruturado em tópicos, o que torna a leitura mais dinâmica e ideal para o público-alvo do livro. No primeiro capítulo, nos é dada uma definição de filosofia, como sendo “uma atividade onde aprendemos a identificar e a pensar com cuidado sobre nossas mais simples idéias e teorias”. Tal definição parece rápida demais; entretanto, nos são apresentadas as conseqüências dessa atividade logo na seqüência, como o motivo para estudarmos filosofia e as implicações da atividade. Este primeiro capítulo é recomendado para todos os cursos de introdução à disciplina, devido à sua clareza e objetividade.

No segundo capítulo os autores tratam da leitura dos diversos tipos de textos filosóficos, muito diferentes dos textos em que os estudantes estão habituados no ensino médio. Tal diferença parece óbvia; entretanto, o contato entre os alunos e os textos filosóficos é nas escolas brasileiras realizado em geral diretamente, sem orientações sobre a leitura e sem recurso a bons textos introdutórios. O objetivo desta obra é orientar os alunos sobre a estrutura de uma bibliografia, as fontes primárias e secundárias e demais recursos bibliográficos a serem utilizados no curso. Na continuação do livro, o terceiro capítulo trata da necessidade de anotações durante a leitura dos textos. Um capítulo destinado a essa atividade parece demasiado; entretanto, uma metodologia de anotações e utilização das mesmas é de extrema importância para a atividade filosófica, como mostram os autores.

Os capítulos 4 e 5 são os mais interessantes do livro, tratando respectivamente do valor da discussão na filosofia e da escrita filosófica. No primeiro deles, os autores dão orientações sobre a importância da discussão na atividade filosófica, principalmente em seminários e grupos de estudo. Em tais momentos, as idéias são refinadas e os erros de raciocínio e preconceitos são eliminados. A discussão mostra-se necessária para a prática filosófica, uma vez que é impossível tratar de idéias e conceitos sem discuti-los.

No quinto capítulo, intitulado “Escrevendo Filosofia”, os autores tratam das práticas de escrita acadêmica na filosofia, principalmente do desenvolvimento dos mais variados tipos de ensaios filosóficos, onde os alunos poderão aprender a expor suas idéias de forma organizada. Uma orientação mais direta é realizada na seção “Como Evitar o Plágio”, onde os autores apontam as diferenças entre citar e copiar trechos de textos de outros filósofos, além de distinguir os modos de construir argumentos em suas colocações. No último capítulo, além de um pequeno glossário de termos filosóficos, é oferecida uma extensa lista de recursos para a pesquisa filosófica, como livros, enciclopédias e antologias sobre diversas áreas da filosofia, e um guia sobre sites confiáveis, muito útil em tempos de internet (tudo em inglês).

A tradução de Vinícius Figueira, com acompanhamento do professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Valério Rhoden, é boa; porém, como o livro foi escrito para estudantes ingleses, falta uma contextualização em alguns pontos, como no capítulo sobre recursos disponíveis para a pesquisa filosófica. Independente desse pequeno deslize, a tradução é muito bem-vinda no Brasil, uma vez que é raro uma obra de introdução para estudantes que ingressam no curso de filosofia, muitas vezes sem saber com que irão lidar. O livro não é útil apenas para estudantes prestes a ingressar nos cursos de filosofia. Também pode ser interessante para alunos que cursam e para os professores, principalmente no Brasil, onde a maioria das instituições e profissionais da filosofia ainda está ligada à prática de comentários e interpretações de filósofos do passado. Sobre esse ponto, os autores deixam claro que é importante estudar e compreender história da filosofia, porém, isso não é suficiente. Para fazer boa filosofia é necessário, além de entender as suas teorias, buscar dialogar e analisar as teorias filosóficas para testar sua plausibilidade.

No “Anúncio do Programa do Semestre de Inverno de 1765-1766”, Immanuel Kant defende que “o jovem que completou a sua instrução escolar habituou-se a aprender. Agora pensa que vai aprender filosofia. Mas isso é impossível, pois agora deve aprender a filosofar”. O objetivo deste livro é justamente esse: preparar os alunos para o propósito de aprender a filosofar.

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Guia para estudar filosofia

Eis a questão: Por onde começar a estudar Filosofia? Acredito que o primeiro passo seja desconstruir a ideia de estar diante de uma disciplina impossível, o conhecimento pode ser visto como uma progressão: pense em um quebra-cabeça colossal, em que todos os dias você coloque uma nova peça ou informação, buscando uma imagem completa daquele conhecimento, cada vez as informações serão maiores e mais complexas e se relacionarão com as informações adicionadas anteriormente, até que por fim, você chegue em uma considerada imagem final e perceba que faltam algumas peças aqui e ali e dê início novamente à busca pelo conhecimento, buscando A Imagem final. Enrolamos até aqui para poder provar a você que aprender Filosofia não é tão complicado, em poucas palavras desenvolvemos uma noção rasa de razão. Nesse sentido, você pode entender o percurso do conhecimento Filosófico como uma progressão histórica e começar a estudar Filosofia por uma cronologia, por objetos de estudo que te interessem mais ou ainda por pensadores que te chamem a atenção. Todo conhecimento é válido, não se prenda à querer saber tudo sobre tudo de todos os lugares, comece por onde for mais confortável pra você. Sobre esse primeiro percurso do conhecimento e discurso filosófico do indivíduo, Marilena Chaui diz¹:

“Experiência da razão e da linguagem, a filosofia é a peculiar atividade reflexiva em que, na procura do sentido do mundo e dos humanos, o pensamento busca pensar-se a si mesmo, a linguagem busca falar de si mesma e os valores (o bem, o verdadeiro, o belo, o justo) buscam a origem e a finalidade da própria ação valorativa. Essa experiência, concretizada no

e pelo trabalho de cada filósofo, constitui o discurso filosófico.

Por que a filosofia é um discurso dotado de características próprias, a iniciação a ela encontra um caminho seguro no ensino da leitura dessa modalidade de discurso, a fim de que os alunos aprendam a descobrir, no movimento e na ordenação das idéias de um texto, a lógica que sustenta a palavra filosófica para que possam analisá-la e comentá-la, primeiro, e

interpretá-la, depois.”

Selecionei alguns livros, Podcasts e Artigos que podem te guiar nesse primeiro momento. Eu comecei a estudar Filosofia por comentadores, ou seja, pela leitura de professores ou especialistas que disponibilizavam suas notas de leitura ou comentavam sobre determinado autor ou obra em suas aulas. Alguns especialistas desaprovam isso, mas acredito que não seja tão perigoso desde que o leitor/ouvinte/espectador tenha consciência e autonomia para não colocar total credibilidade no comentário sem antes ter acesso ao original. As traduções, ademais, também correm esse risco, mas no caso de não ter conhecimento das línguas originais é recomendável ler mais versões de um mesmo texto e comparar os termos.

[A seleção foi feita a partir de uma cronologia da Filosofia Ocidental, introdução à uma Filosofia Oriental, proximidade cultural com os leitores e estudiosos brasileiros de Filosofia, priorizando autoras e pesquisadoras e materiais de grandes universidades internacionais, esperando que a partir dessas leituras os iniciados possam direcionar-se aos livros originais comentado pelos autores e autoras].

Filosofando: introdução a filosofia – Maria Helena Pires Martins e Maria Lúcia de Arruda Aranha

[ACADEMIA]

“Nesta obra, além da problematização dos conceitos básicos, são explicitados os fundamentos antropológicos, epistemológicos e axiológicos que se encontram subjacentes a toda práxis, condição necessária para identificar a orientação das construções teóricas e tornar intencional a prática educativa. Com a seleção de teorias pedagógicas, desde as tradicionais até as mais contemporâneas, é oferecida a oportunidade de se analisar como aqueles conceitos têm sido aplicados de modo variado nas diversas tendências.”

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Convite à Filosofia – Marilena Chaui

“Um exercício do pensamento, que fomenta a reflexão crítica e lança um facho de luz sobre questões do dia-a-dia, realçando seu caráter histórico e ampliando os horizontes do leitor – eis o alcance deste livro. Convite à Filosofia é uma obra que utiliza o próprio instrumental filosófico para atualizar conceitos e fazer uma releitura dialética do mundo por uma das mais consistentes intelectuais do país. De suas páginas emergem os grandes temas da discussão filosófica, como Razão, Verdade, Conhecimento, Ciência, Ética, Política, Arte, Técnica, Religião, Metafísica, História, Lógica.”

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Apologia de Sócrates – Platão

“O julgamento de Sócrates (469-399 a.C.) foi um dos fatos históricos mais importantes da Grécia Antiga e até hoje inspira escritores, artistas e filósofos. Em 399 a.C., Atenas estava se recompondo após a derrota para Esparta na Guerra do Peloponeso, tentando consolidar o ainda frágil regime democrático. O posicionamento crítico de Sócrates pareceu uma afronta aos costumes da cidade e ele foi incriminado, julgado e condenado à morte por envenenamento sob as acusações de não cultuar os deuses da cidade, tentar introduzir novas divindades e corromper a juventude com suas idéias. As acusações não intimidaram o pensador, que decidiu conduzir a própria defesa, dando origem aos textos aqui reunidos, Êutifron, Apologia de Sócrates e Críton. São obras que partem da discussão filosófica, mas assumem ramificações religiosas, políticas e éticas, mostrando por que Sócrates passou para a História como fundador da tradição filosófica ocidental.

Quem nos apresenta Sócrates é Platão (427-347 a.C.), um dos seus mais dedicados discípulos, que revela o mestre à sua maneira, retratando o cidadão que os atenienses encontravam pelas ruas – um homem íntegro e coerente, cuja missão de vida era a busca do conhecimento e de sua aplicação. Ao mesmo tempo que preserva o legado do sábio, Platão apresenta as linhas gerais do seu próprio pensamento sobre teologia, ética, teoria política, bem como sua visão sobre a vida após a morte e o dualismo corpo/alma.”

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Iniciação à Estética – Ariano Suassuna

[LE LIVROS]

“Para os que só conhecem o nome de Ariano Suassuna como o autor de Auto da compadecida, obra que renovou por dentro a cena brasileira, certamente surpreenderá esta “Iniciação à estética”. São raros os criadores também dotados de fôlego teórico e crítico. Mas em Suassuna, junto com a paixão do teatro reconhecemos o carisma do mestre, do estudioso que sabe transmitir ao leitor a sua vasta cultura humanística elaborada em longos anos de pesquisa e educação. Iniciação à estética é mais do que um manual, como o seu título didático sugere tão modestamente. Trata-se de um percurso que não se esgota no universo da informação. O leitor é convidado e entrar nas grandes teorias clássicas e modernas que há mais de dois milênios se vêm debruçando sobre os conceitos complexos de Beleza e Arte. De Platão e Aristóteles aos escolásticos e a Kant; de Kant a Hegel e a Bérgson, o roteiro pontua as principais correntes filosóficas da Estética. Da história das idéias passa o autor a enfrentar os tópicos centrais da gênese e da diferenciação das artes: escultura, arquitetura, pintura, música, mímica, literatura, teatro (ou, mais amplamente, as artes de espetáculo). Devemos agradecer a este Mestre que logrou o maior dos tentos: ser profundo sem deixar de ser cristalino. Diante de Ariano Suassuna todos nos sentimos discípulos que não cessam jamais de aprender.” – Alfredo Bosi 

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Livro da Alma – Ibn Sinã 

[LE LIVROS]

“O Livro da alma, do filosofo persa Ibn Sina (ou Abu Ali al-Hussein ibn Abd-Allah ibn Sina, conhecido no Ocidente pelo nome latinizado de Avicena, e um dos maiores clássicos da filosofia medieval, agora publicado em português em tradução direta do árabe pelo professor e especialista nesse autor, Miguel Attie Filho, também responsável pela introdução, notas e glossário, e contando ainda com prefacio de Carlos Arthur Ribeiro do Nascimento. 

Como se sabe, enquanto a Europa medieval perdera contato com o antigo mundo clássico, os árabes, a partir de sua expansão para alem da Península Arábica, iniciada no seculo VII, depararam-se, no Mediterrâneo Oriental, então dominado pelo Império Bizantino, de língua grega e herdeiro da cultura greco-romana, com parte dessa cultura ainda preservada. O contato da cultura árabe com a herança greco-romana fez nascer, entre outros, a filosofia em árabe (Falsafa), que teve no dialogo com a obra de Aristóteles e nas pessoas de Ibn Rushid (Averrois) e Ibn Sina (Avicena) seus marcos principais.”

Artigos

Avicena e a filosofia oriental: história de uma controvérsia

(2) (PDF) Avicena e a filosofia oriental: história de uma controvérsia. Available from: https://www.researchgate.net/publication/325164270_Avicena_e_a_filosofia_oriental_historia_de_uma_controversia [accessed May 03 2020].

Rosalie Helena de Souza Pereira       

Mestre em Filosofia (FFLCH-USP), Doutora em Filosofia (IFCH-UNICAMP), pesquisadora em estágio de Pós-Doutorado no Programa de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). 

Antologia de Textos Filosóficos

Organização: Jairo Marçal

Available from: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/cadernos_pedagogicos/caderno_filo.pdf [accessed May 03 2020].

Podcasts e Vídeos

Guia para estudar filosofia

A Romp Through Philosophy for Complete Beginners – Marianne Talbot

Filosofia para leigos – Introdução à filosofia – Marcia Tiburi

O que você achou dos materiais? Não se esqueça de deixar nos comentários sua relação com os textos e links antes e depois da sua leitura! Obrigada!

¹CHAUI, Marilena. Prefácio In: MARÇAL, Jairo (Org.). Antologia de Textos Filosóficos Curitiba: SEED – Pr, 2009. P. 9.

Stella D'Avansso é filósofa, escritora, restauradora de arte, pesquisadora em Estética e Filosofia da Arte e artista multidisciplinar. É Técnica em Conservação e Restauração de Bens Móveis pelo Centro Técnico Templo da Arte e graduanda em Filosofia pela UNIFESP, sua pesquisa centra-se na filosofia estética das artes grotescas. Educadora e ativista pela democratização do conhecimento, atualmente ministra oficinas culturais na cidade de Diadema. Possui obras literárias publicadas e premiadas internacionalmente, além de realizar intervenções musicais na banda "Auear", em atividade desde 2019. Pratica e estuda as Artes do Corpo desde muito cedo, sendo o contorcionismo uma de suas paixões! Ver todos os posts por Stella D'Avansso