Quais são as regiões do mundo que apresentam maiores porcentagens de população subnutrida

O número dos que passam fome no mundo aumentou pelo terceiro ano seguido e afeta 821 milhões de pessoas, de acordo com relatório divulgado por agências da ONU. Isso corresponde a uma a cada nove pessoas no mundo. No Brasil, os números apontam que mais de 5,2 milhões de pessoas passaram um dia ou mais sem consumir alimentos ao longo de 2017, o que corresponde a 2,5% da população.

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As principais causas do aumento da fome no mundo são os conflitos e os fenômenos climáticos em constante alteração, indica o relatório. Os resultados apresentados na FAO, uma das agências envolvidas no levantamento, são considerados um retrocesso pelo diretor-geral da entidade, José Graziano da Silva. De acordo com os dados, os números atuais mostram indicadores semelhantes aos apresentados há uma década.

"A situação está piorando na América do Sul e na maioria das regiões da África. Igualmente, a tendência de queda observada na Ásia segue em desaceleração", afirma o documento "O estado da segurança alimentar e da nutrição no mundo", que foi elaborado pela FAO, OMS, PMA, Unicef e Ifad.

A maior parte dos famintos do mundo está na Ásia, continente que abriga mais de 514 milhões de pessoas consideradas subnutridas; seguido da África onde 239 milhões de pessoas passam fome.

América Latina

Na América Latina e no Caribe, a fome também apresentou aumento e afeta cerca de 39 milhões de pessoas. Embora o nível de fome seja relativamente baixo em comparação com outras regiões, esse aumento na América Latina é explicado, principalmente, pela desaceleração econômica na América do Sul, afirmou à Agência Efe, o diretor de Estatística da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), José Rosero.

Nesta região, a prevalência de desnutrição (ou falta crônica de nutrientes) subiu de 4,7% da população em 2014 para 5% projetada para 2017 ou, em termos absolutos, de 19,3 milhões de habitantes para 21,4 milhões.

Durante o mesmo período, essa taxa diminuiu no Caribe, afetando 16,5% da população no ano passado (7 milhões de pessoas com fome).

O relatório indica que a tendência de alta na América do Sul pode ser o resultado da persistência dos preços baixos para a maioria dos produtos básicos exportados, especialmente o petróleo.Isso reduziu a capacidade de importar alimentos, investir na economia por parte dos governos e proteger as pessoas mais vulneráveis diante da redução das receitas fiscais.

"A desaceleração econômica é observada na América do sul, o que é explicado especialmente pela situação na Venezuela", disse Rosero, afirmando que no país sul-americano, a taxa média de desnutrição foi de 11,7% da população entre 2015 e 2017 (3,7 milhões de venezuelanos no total), quase quatro vezes mais que no triênio 2010-2012.

Em toda a região, as maiores porcentagens de fome nos últimos três anos foram no Haiti (45,8% de sua população, equivalente a 5 milhões de pessoas), Bolívia (19,8% da população, 2,2 milhões) e Nicarágua (16,2% da população, 1 milhão).

No Brasil, o número de pessoas consideradas subnutridas é de cerca de 5,2 milhões, o que corresponde a 2,5% da população. Os números representam uma melhora nos indicativos nacionais, cujos dados referentes a 2004-2006 mostravam que 8,6 milhões dos brasileiros eram subnutridos na época, o correspondente a 4,6% da população.

Aumento da anemia e queda na desnutrição infantil

O documento destaca ainda que a obesidade em adultos continua em alta. Em 2012, afetava 11,7% da população e, em 2016, atingia 13,2% (672,3 milhões de pessoas, ou seja, mais de um em cada oito adultos). No Brasil, 22,3% da população acima dos 18 anos está acima do peso ideal.

As agências da ONU chamam de "vergonhoso" o aumento da anemia entre mulheres em idade reprodutiva. O problema afetava 32,8% em 2016, com "importantes consequências para a saúde" destas e de seus filhos.

O relatório aponta, porém, alguns progressos na área infantil. A desnutrição das crianças permanece em queda, enquanto desde 2012 a proporção mundial de menores de idade com sobrepeso parece, ao menos, controlada, com 5,6% (38,3 milhões) em 2017.

Mudança climática

Como alguns fenômenos extremos climáticos "não podem ser atribuídos" diretamente à mudança climática, o documento da FAO evita utilizar o termo. Aponta, porém, que, entre 1990 e 2016, eventos como o calor extremo, as secas, as inundações e as tempestades dobraram, com média anual de 213."As mudanças no clima já estão enfraquecendo a produção dos principais cultivos em regiões tropicais e temperadas", relata a FAO."Nos últimos dez anos, 36% dos países que sofreram um aumento na subalimentação também registraram uma seca", diz Dominique Burgeon, diretor de Emergências da organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO).

A variabilidade do clima e os eventos extremos "ameaçam derrubar e reverter os avanços alcançados para a eliminação da fome", adverte o relatório.

(Com EFE, AFP e RFI)

Roma, 13 de julho de 2020 – Mais pessoas estão passando fome, segundo um estudo anual da ONU. Dezenas de milhões se juntaram às fileiras de subnutridos crônicos nos últimos cinco anos, e países ao redor do mundo continuam lutando com múltiplas formas de desnutrição.

A última edição do relatório O Estado da Insegurança Alimentar e Nutricional no Mundo, publicado hoje, estima que quase 690 milhões de pessoas passaram fome em 2019 – um aumento de 10 milhões em relação a 2018 e de aproximadamente 60 milhões em cinco anos. Altos custos e baixo poder aquisitivo também significam que bilhões não podem comer de maneira saudável ou nutritiva. As pessoas passando fome são mais numerosas na Ásia, mas esse número aumenta mais rapidamente na África. Em todo o planeta, prevê o relatório, a pandemia de Covid-19 pode levar mais de 130 milhões de pessoas à fome crônica até o final de 2020. Surtos de fome aguda no contexto da pandemia podem ver esse número aumentar ainda mais em momentos como este.

O Estado da Insegurança Alimentar e Nutricional no Mundo (disponível em inglês) é o estudo global mais oficial que acompanha o progresso em relação a acabar com a fome e a desnutrição. É produzido em conjunto pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Programa Mundial de Alimentos da ONU (PMA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Escrevendo no Prefácio, os chefes das cinco agências alertam que "cinco anos após o mundo se comprometer a acabar com a fome até 2030, a insegurança alimentar e todas as formas de desnutrição, ainda estamos fora do caminho para alcançar esse objetivo ".

Os números da fome explicados
Nesta edição, atualizações críticas de dados para a China e outros países populosos levaram a um corte substancial nas estimativas do número global de pessoas com fome, para os atuais 690 milhões. No entanto, não houve mudança na tendência. A revisão de toda a série da fome até o ano 2000 produz a mesma conclusão: depois de diminuir constantemente por décadas, a fome crônica começou lentamente a aumentar em 2014 e continua a fazê-lo.

A Ásia continua sendo o lar do maior número de desnutridos (381 milhões). A África vem em segundo lugar (250 milhões), seguida pela América Latina e o Caribe (48 milhões). A prevalência global de subnutrição – ou porcentagem geral de pessoas com fome – mudou pouco em 8,9%, mas o número absoluto tem aumentado desde 2014. Isso significa que, nos últimos cinco anos, a fome cresceu em sintonia com a população global.

Isso, por sua vez, esconde grandes disparidades regionais: em termos percentuais, a África é a região mais atingida e cada vez mais, com 19,1% de sua população desnutrida. Isso é mais que o dobro da taxa na Ásia (8,3%) e na América Latina e no Caribe (7,4%). Nas tendências atuais, em 2030, a África abrigará mais da metade das pessoas com fome crônica no mundo.

O preço da pandemia
À medida que o progresso no combate à fome estanca, a pandemia de Covid-19 está intensificando as vulnerabilidades e inadequações dos sistemas alimentares globais – entendidos como todas as atividades e todos os processos que afetam a produção, a distribuição e o consumo de alimentos. Embora seja muito cedo para avaliar o impacto total dos bloqueios e outras medidas de contenção, o relatório estima que, no mínimo, outros 83 milhões de pessoas, e possivelmente até 132 milhões, possam passar fome em 2020 como resultado da recessão econômica desencadeada pela Covid-19. O revés coloca em dúvida o alcance do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 2 (Acabar com a fome).

Dietas não saudáveis, insegurança alimentar e desnutrição
Superar a fome e a má nutrição em todas as suas formas (incluindo desnutrição, deficiências de micronutrientes, sobrepeso e obesidade) é mais do que garantir comida suficiente para sobreviver: o que as pessoas comem – e especialmente o que as crianças comem – também deve ser nutritivo. No entanto, um obstáculo fundamental é o alto custo de alimentos nutritivos e a baixa acessibilidade a dietas saudáveis para um grande número de famílias.

O relatório apresenta evidências de que uma dieta saudável custa muito mais que US$ 1,90 por dia, o limiar de pobreza internacional. Isso coloca o preço até mesmo da dieta saudável menos cara em cinco vezes o preço de forrar estômagos apenas com amido. Laticínios ricos em nutrientes, frutas, vegetais e alimentos ricos em proteínas (de origem vegetal e animal) são os grupos de alimentos mais caros do mundo.

As estimativas mais recentes são de que três bilhões de pessoas ou mais não podem pagar por uma dieta saudável. Na África ao sul do Saara e na Ásia Meridional, esse é o caso de 57% da população – embora nenhuma região, incluindo a América do Norte e a Europa, seja poupada. Em parte como um resultado, a corrida para acabar com a desnutrição parece comprometida. Segundo o relatório, em 2019, entre um quarto e um terço das crianças com menos de cinco anos (191 milhões) sofrem de marasmo ou atraso no crescimento – muito baixas para a idade ou muito magras. Outros 38 milhões de crianças menores de 5 anos estavam acima do peso. Entre os adultos, enquanto isso, a obesidade se tornou uma pandemia global por si só.

Uma chamada à ação
O relatório argumenta que, uma vez levadas em consideração as questões de sustentabilidade, uma mudança global para dietas saudáveis ajudaria a reverter o declínio em relação à fome, ao mesmo tempo em que proporcionaria enormes economias. Calcula que essa mudança permitiria compensar quase inteiramente os custos de saúde associados a dietas não saudáveis, estimados em US$ 1,3 trilhão por ano em 2030; enquanto o custo social relacionado à dieta das emissões de gases de efeito estufa, estimado em US$ 1,7 trilhão, pode ser reduzido em até três quartos.

O relatório pede uma transformação dos sistemas alimentares para reduzir o custo de alimentos nutritivos e aumentar a acessibilidade a dietas saudáveis. Embora as soluções específicas sejam diferentes de país para país, e mesmo dentro deles, as respostas gerais estão em intervenções ao longo de toda a cadeia de suprimento de alimentos, no ambiente alimentar e na política econômica que molda as políticas de comércio, despesa pública e investimento. O estudo apela aos governos para que integrem a nutrição em suas abordagens à agricultura; trabalhem para reduzir os fatores que aumentam os custos na produção, armazenamento, transporte, distribuição e comercialização de alimentos – inclusive reduzindo ineficiências e perdas e desperdícios de alimentos; apoiem os pequenos produtores locais no cultivo e venda de alimentos mais nutritivos e na garantia de seu acesso aos mercados; priorizem a nutrição infantil como a categoria de maior necessidade; promovam a mudança de comportamento por meio da educação e comunicação; e incorporem nutrição nos sistemas nacionais de proteção social e estratégias de investimento.

Os chefes das cinco agências das Nações Unidas por trás do relatório O Estado da Insegurança Alimentar e Nutricional no Mundo declaram seu compromisso em apoiar essa mudança importante, garantindo que ela se desenvolva "de maneira sustentável, para as pessoas e o planeta".